Raimundo


Mexendo no meu baú eletrônico, topei com umas fotos de Raimundo, que fiz em Andaraí.
Raimundo. Segundo me disseram, louco, depois que passou um tempo em São Paulo e comido do pão que o diabo amassou.
Bem sei que é solitário. Vive numa casa estreita de frente para a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, cheia de folhas de papelão, mensagens, trepadeiras e pés de milho florescentes.
A primeira vez que vi estava fazendo café numa fogueira na frente de casa. Na rua mesmo. Gentilmente convidada recusei, mas hoje penso que teria sido bem mais agradável, autêntico e humano se eu tivesse me sentado com ele no passeio alto e tomado o café. Às vezes me ataca essa boçalidade.
Agora sinto falta dessa disponibilidade de simplesmente estar em qualquer lugar, sem (pré) juízos e sem (pré) valorações.
Depois, que eu pensasse sobre. Momentos são únicos e valem ser vividos, simplesmente. Hoje à distância, posso me dar o luxo de pensar sobre Raimundo e sua mania de catar papelão. Sua solidão, suas frases, sua casa decorada.
Já vi que esse texto vai ficar longo. E Raimundo foi o pretexto pra falar de coisas que sempre estiveram presentes na memória. A loucura, a solidão e, principalmente, a incapacidade de apenas viver o momento.
São vírus pessoais? Não creio. Mesmo que ninguém pense a respeito, é claro que todos vivemos isso. E o pior, vivemos na maioria das vezes como se nada disso nos dissesse respeito.
Somos todos um pouco loucos, pois não? Principalmente aqueles que torcem o nariz e dizem: – Louco? Eu? Voce tá louco!
Solitários também somos, mesmo os que vivem empencados com outros tantos. No fim do dia, no fim da vida, no final das contas, é você e você. Juntos e inseparáveis. Os outros são os outros. Estão além de você.
E quanto à nossa incapacidade de apenas viver o momento, sem elucubrações maiores, sem comentários. Estamos tão imersos no sistema de consumo que consumimos até o tempo e a vida. Pena que no mais das vezes, consumimos por nada. E perdemos essa capacidade de Raimundo de apenas ser feliz. Por nada.

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