Reflexões profundíssimas sobre o processo de envelhecer

Percebo que envelheço.
Minha filha me disse hoje que eu sempre repito uma mesma frase: “me lembro de quando eu tinha essa idade”. Claro que, nesse caso, sempre me refiro à neta de treze anos.
Por isso a conclusão: envelheço. Pois claro, ao final voltamos ao início.
Pensamentos profundos. Tudo por conta da meia noite do trinta e um que se aproxima. Pois é, dia e hora de bruxas, insônias e crises.
Estou lendo Dercy de cabo a rabo. Concordo com ela em gênero, número e grau, quando diz: “Fiz oitenta e sete anos. Mas não sou velha. Velho é quem está caduco, velhas são as pessoas que não tem mais o que fazer, que ficam encostadas, incomodando.”
Não estou fazendo oitenta e sete, mas espero fazê-los com a mesma garra. E sem ficar velha.
Voltando ao início, percebo que envelheço.
Essa é uma percepção que vem aos arrancos. Por longos períodos me percebo apenas em espírito e persona e imagino que o corpo me acompanha. De repente, alguma coisa me faz lembrar o passar do tempo sobre mim. Hoje foi essa frase. Ontem uma primeira percepção de rugas, numa olhada casual num espelho e o choque: “não sou mais eu mesma!”. Amanhã, provavelmente, outro pequeno empecilho ao livre fazer do meu espírito.
Mudei. Muito. As coisas e as pessoas mudam sempre. O grande problema é que nem sempre conseguimos perceber as mudanças lentas que nos acometem.
Costumamos pensar nossa imagem com a juventude que reflete a vivacidade do nosso espírito. O corpo envelhece. O espírito não. Por isso, envelhecer requer uma grande dose de sabedoria e paciência. Sabedoria para entender que somos jovens por dentro, mas que nosso corpo se deteriora aos poucos como tudo o mais nesse universo relativo em que vivemos.
Conciliar um corpo envelhecido e um espírito jovem requer paciência. Muita. É o corpo após os sessenta quem começa a ditar os limites da nossa ação.
Requer também, talvez mais ainda, disciplina. Uma disciplina que deveria ser cultivada desde sempre. Mas, pensando bem, a vida seria muito chata se não pudéssemos, de vez em quando e sempre, jogar para o alto todas as regras e normas.
Regras e normas são ótimas, mas não pra todos. Alguns, como eu, somos feitos de água, muita água e estamos sujeitos ao ciclo das marés, que como todos sabemos varia de acordo com a lua.
Por isso, após constatar o óbvio, envelheço. Mas sem muita paciência para os limites. Ainda gosto de voar alto, num céu azul, com ou nuvens, com ou sem borrasca, porque raios e trovões também fazem parte do meu ser.
Envelheçamos, pois, felizes.

Deixe um comentário