Um papo sobre famílias.

A sexta à noite foi para um encontro de família. Sobrinha, sobrinhos netos e neta. Como não podia deixar de ser a conversa girou em torno da família.

Um acha que minha família de origem era disfuncional, incapaz de agregar seus descendentes num todo harmônico – prá mim era bem coerente! – respondi.  Conversa finda, fiquei pensando, repassando o  que sei sobre famílias em geral e sobre a minha em particular.

Gosto muito de metáforas e simbolismos. Acho que assim para os que não pensam como eu fica mais fácil entender do que falo. Então, lá vai, explicando o que entendo sobre famílias posso usar a casa como exemplo:

A casa é encontrável em qualquer espaço e tempo e pode ser descrita como uma estrutura construída, fechada mas permeável ao exterior, com alicerces, paredes e cobertura, feitas para abrigar pessoas. Nessa definição de casa encaixam-se todas as casas – casas de taipa, coloniais, art deco, modernas, pos-modernas, palafitas, ocas e por aí vai.

O que não podemos fazer é analisar as casas por um parâmetro específico independente do tempo-espaço onde foi construída, porque cada uma delas é funcional e harmônica com o ambiente, o tempo histórico e as necessidades dos habitantes. Por exemplo, casas coloniais eram bastante funcionais quando foram construídas e atendiam perfeitamente aos critérios culturais e físicos que determinaram sua construção:

– as paredes eram grossas, em adobão, isolando o clima interno do externo;

– a telha vã facilitava a circulação do ar

– a cumeeira era muito alta e as paredes internas baixas, fazendo o ar circular nos ambientes;

– os ambientes internos eram divididos de acordo com o tamanho e a necessidade da família, por isso as latrinas ficavam fora da casa sobre fossa séptica;

– a construção das casas geminadas e padronizadas facilitava o controle de impostos pela Coroa.

Hoje, construir uma casa colonial seria um anacronismo, porque nossa cultura exige casas diferentes, num modelo que atenda às necessidades atuais e corresponda em tecnologia, desenho e funcionalidade aos dias de hoje.

Com as famílias não é diferente. Não podemos nos esquecer que não existe um modelo ideal de família, mas elas são funcionais ou harmônicas dentro de um contexto. Eu não entendo uma família construída na primeira metade do século XX a não ser se considero a cultura vigente na primeira metade do século XX, as condições de formação e de vida daquela família específica, sua história.

Como as pessoas, famílias são o que são. Nem mais nem menos. Se, como psicóloga, vou atuar com família, tenho que pensar no contexto em que essa família vive, independente do meu modelo de família ideal.

Penso que, também como os indivíduos, as famílias tem seus próprios mecanismos de ação e de interação. Esses podem ser funcionais e harmônicos ou disfuncionais e desarmônicos, mas apenas para aquela família (nem sempre o que serve pra Zé Carroceiro vale também pra Zeca Roceiro). Por exemplo, se eu encontrasse hoje uma família em que todos os integrantes pensam da mesma forma, não discutem, não brigam entre si, não apresentam divergências, eu ficaria seriamente preocupada com a saúde mental de seus membros.

Porque famílias são feitas por pessoas e pessoas são naturalmente diferentes umas das outras em imagem, pensamentos, palavras e ação. Essa é a beleza da humanidade.